Nesta Quaresma, somos chamados por Jesus
Cristo a viver o jejum, a esmola e a oração, com coerência e
autenticidade, para vencermos o egoísmo e a hipocrisia. Que esta
Quaresma seja para nós um tempo de afastamento do pecado e do mundo, mas
também de aproximação de Deus e dos irmãos. Não pensemos que tudo vai
bem se estamos bem. Precisamos entender que o que conta não é a
aprovação dos homens, a busca pelo sucesso em nossos empreendimentos,
mas a pureza de nosso coração e a nossa comunhão com Deus. Dessa forma,
reencontraremos a verdadeira identidade cristã, ou seja, “o amor que
serve, não o egoísmo que se serve”[1].
Pois, o próprio Filho de Deus não veio para ser servido, mas para
servir e dar a sua vida pela salvação de muitos (cf. Mc 10, 45).
Neste início do tempo quaresmal, caminhemos
juntos, como Igreja, e recebamos as cinzas, recordando que também nós
retornaremos às cinzas (cf. Gn 3, 19). Neste caminho espiritual,
mantenhamos nosso olhar fixo no Crucificado. Pois, Jesus Cristo nos ama e
nos convida a deixarmo-nos reconciliar com Deus (cf. 2 Cor 5,20), a nos
voltar para Ele de todo coração, para assim nos encontrar com nossos
irmãos.
O jejum como cura para as desordens do pecado
As Sagradas Escrituras e a Tradição da
Igreja ensinam que o jejum é um auxílio extraordinário para evitarmos o
pecado e tudo o que nos conduz a ele. Por isso, na história da salvação,
somos frequentemente convidados a jejuar. Nas primeiras páginas do
Antigo Testamento já temos a ordem do Senhor para que o gênero humano se
abstenha de comer o fruto proibido: “Podes comer o fruto de todas as
árvores do jardim; mas não comas o da árvore da ciência do bem e do mal,
porque, no dia em que o comeres, certamente morrerás” (Gn 2, 16-17).
Comentando esta ordem de Deus, São Basílio observa que “o jejum foi
ordenado no Paraíso”, e que “o primeiro mandamento neste sentido foi
dado a Adão”[2]. Dessa forma, o Senhor nos deu a lei do jejum e da abstinência.
Tendo em vista que todos nós estamos
entorpecidos pelo pecado e pelas suas consequências, o jejum nos é
oferecido como um meio para restabelecer a nossa amizade com Deus. Isto
fez Esdras, antes da viagem de volta do exílio da Babilônia para
Jerusalém, convidando o povo reunido a jejuar “para nos humilhar diante
do nosso Deus” (Esd 8, 21). Deus Todo-Poderoso ouviu a sua prece e
garantiu os seus favores e a sua proteção ao Povo de Israel. O mesmo
fizeram os habitantes de Nínive que, sensíveis ao apelo de Jonas ao
arrependimento, proclamaram um jejum a todos os habitantes da cidade:
“Quem sabe se Deus não Se arrependerá, e acalmará o ardor da Sua ira, de
modo que não pereçamos?” (Jn 3, 9). Como o Povo de Israel, Deus também
viu que os habitantes de Nínive arrependeram-se de seus maus caminhos e
os poupou do castigo iminente.
A oração e a nossa amizade com Deus
São Pedro Crisólogo ensina que “o jejum é a alma da oração”[3].
Sendo assim, o jejum quaresmal certamente favorecerá de modo muito
particular a nossa vida de oração. Pois, se o jejum nos afasta do pecado
e nos ajuda a restabelecer nossa amizade com Deus, a oração nos ajuda a
aprofundar essa amizade. Sendo assim, nesta Quaresma temos uma
oportunidade extraordinária de nos aproximar de Deus, de nos dirigir a
Ele em súplica pela humanidade, que caminha na direção oposta.
Quando nos alimentamos espiritualmente com
uma contínua oração, demonstramos efetivamente a primazia de Deus em
nossa existência. Além disso, a oração exige que sejamos humildes, que
reconheçamos que não somos autossuficientes, mas que necessitamos do
Senhor por toda a vida, especialmente neste tempo quaresmal.
Como expressão dessa dependência de Deus,
podemos rezar de vários modos nesta Quaresma. Em primeiro lugar, a
Liturgia da Santa Missa é a oração por excelência. Nela, oferecemos a
Deus a adoração, a ação de graças, a reparação pelos pecados e a súplica
ou oração de petição, o sacrifício que o próprio Cristo ofereceu ao Pai
por nós definitivamente no altar da Cruz. A adoração ao Santíssimo
Sacramento deve ocupar também um lugar importante em nossa vida de
oração. Quanto mais participamos da Santa Missa e nos colocamos em
adoração ao Santíssimo, mais aprofundamos a nossa oração pessoal ou
oração de intimidade. Na meditação pessoal, os livros espirituais e as
Sagradas Escrituras são muito recomendáveis. Por fim, nesta Quaresma,
indicamos também a oração do Terço ou Rosário mariano, especialmente com
a meditação dos mistérios dolorosos.
A íntima ligação entre as três obras quaresmais
São Pedro Crisólogo ensina que “o jejum é a
alma da oração e a misericórdia é a vida do jejum, portanto quem reza
jejue. Quem jejua tenha misericórdia. Quem, ao pedir, deseja ser
atendido, atenda quem a ele se dirige. Quem quer encontrar aberto em seu
benefício o coração de Deus não feche o seu a quem o suplica”[4].
Sendo assim, se o jejum favorece oração e nos conduz a ela, a oração,
por sua vez, leva-nos ao desapego dos bens materiais e à generosidade
para com o próximo, especialmente os mais necessitados.
Portanto, compreendemos que as três obras
quaresmais: o jejum, a oração e a esmola, estão intimamente ligadas
entre si. Por isso, se queremos viver bem este tempo da Quaresma,
precisamos praticar essas três obras, que nos conduzem respectivamente a
abandonar os nossos pecados e a nos aproximar de Deus e de nossos
irmãos.
Neste Ano Nacional Maria, peçamos a Nossa
Senhora que nos ajude a viver este tempo da Quaresma não como mais um em
nossas vidas, mas como aquele no qual rompemos radicalmente com o
pecado e nos aproximamos de Deus a tal ponto de podermos dizer com São
Paulo: “Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em mim” (Gl 2,
20). Dessa forma, poderemos também dizer com o Apóstolo dos gentios:
“Fiz-me tudo para todos, a fim de salvar a todos” (1 Cor 9, 22).
Links relacionados:
PADRE PAULO RICARDO. A Quaresma da oração.
TODO DE MARIA. A mensagem de Lourdes para a Quaresma.
TODO DE MARIA. A Quaresma da Misericórdia com Maria.
TODO DE MARIA. Quaresma: tempo de penitência e conversão.
Referências:
[2] SÃO BASÍLIO MAGNO. Sermo de jejunio: PG 31, 163, 98. In Mensagem de sua Santidade o Papa Bento XVI para a Quaresma de 2009.
[3] SÃO PEDRO CRISÓLOGO. Sermo 43; PL 52, 320.332. In Mensagem de sua Santidade o Papa Bento XVI para a Quaresma de 2009.
[4] Idem, ibidem.
Natalino Ueda é brasileiro, católico, formado em Filosofia e Teologia. Na consagração a Virgem Maria, segundo o método de São Luís Maria Grignion de Montfort, explicado no seu livro “Tratado da Verdadeira Devoção a Santíssima Virgem”, descobriu o caminho fácil, rápido, perfeito e seguro para chegar a Jesus Cristo. Desde então, ensina e escreve sobre esta devoção, o caminho “a Jesus por Maria”, que é hoje o seu maior apostolado.
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